Eu costumava ter medo de altura. Certo
dia escorreguei no chão molhado pela urina do filhote e despenquei do terraço. Assim,
perdi o medo, quebrei a perna esquerda e fraturei a clavícula — que só então eu soube onde fica.
Quando
deixei a bengala, o filhote já nem era mais filhote. Ocupava sozinho
todo o assento da poltrona. Tinha um latido grosso parecido com resmungo de
velho ranzinza e o péssimo hábito de montar nas visitas.
Já faz um tempo que o velho filhote se foi. Os meninos, ao redor da
poltrona, não queriam saber de consolo. Adotamos um gato a que chamamos de Chico
por causa do Cezar da música triste que Rosa cantava pra eles dormirem. Não deu
muito certo.
É verdade que Chico sabia descer do terraço melhor do que eu, mas nunca
aprendeu a diferença entre o sofá da sala e a caixa de areia. Dormia na
caixa e fazia cocô no sofá.
Dei-o de presente de natal ao vizinho da direita, com quem antipatizo graças a seu péssimo gosto musical. Foi quando assumi a poltrona e, consequentemente,
as responsabilidades do filhote.
Agora sou eu quem brinca com as crianças e resmunga como um velho
ranzinza. Só não faço xixi no terraço — não quero que ninguém
frature a clavícula — nem monto nas visitas, porque isso não se faz.
Nenhum comentário:
Postar um comentário